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Guerra de dois anos de Israel devasta o meio ambiente de Gaza, provocando ação global

A guerra de Israel em Gaza causa um ecocídio ambiental sem precedentes, ameaçando ecossistemas globais e exigindo ação internacional urgente na COP30.

Por: Maryam QarehgozlouHispanTV

Uma bandeira palestina ondula entre os escombros de edifícios destruídos durante a ofensiva israelense em Rafah, no sul de Gaza. (Foto de arquivo/Reuters)

Ao lado de um abarrotado abrigo em Gaza, montes de lixo liberam chorume no solo, cujo cheiro desagradável se espalha no ar.

As famílias amontoadas no abrigo suportam o fedor sufocante do chorume vindo do aterro próximo, um sombrio lembrete de que o custo da guerra genocida de Israel se estende para além do campo de batalha, atingindo o meio ambiente.

A magnitude dos danos ambientais no território é extensa: a destruição e o colapso dos sistemas de tratamento de água e esgoto, a contaminação de fontes de água, os entulhos tóxicos de edifícios destruídos e dezenas de milhares de munições, além dos danos generalizados às terras agrícolas e aos sistemas alimentares.

Esses impactos se propagam, ameaçando civis, os ecossistemas e a saúde ambiental em geral.

Em maio, a missão palestina no Reino dos Países Baixos descreveu formalmente a destruição ambiental em Gaza como ecocídio.

A declaração, a primeira de um ator em nível estadual a usar explicitamente o termo em relação a Gaza, marcou um desenvolvimento significativo no crescente discurso internacional sobre os danos ambientais e a responsabilidade durante o cerco à estreita faixa de terra.

Após esse reconhecimento, uma campanha midiática de base (grassroots), liderada por ativistas pró-palestinos e ambientalistas, foi lançada para destacar o ecocídio em Gaza, condenando a devastação não apenas como uma crise humanitária, mas também como um dos desastres ambientais mais urgentes do mundo.

Com os ecossistemas de Gaza entrando em colapso sob o peso do genocídio e do bloqueio contínuos, a “Campanha Ecogenocídio” visa colocar as ações de Israel sob escrutínio global na 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança Climática (COP30), que será realizada em novembro de 2025 em Belém, Brasil.

A iniciativa busca gerar impulso na contagem regressiva para a COP30, mobilizando jornalistas, defensores do meio ambiente e ativistas para amplificar o custo ambiental da guerra genocida de Israel.

Por meio de esforços tanto online quanto no terreno, os ativistas buscam aumentar a conscientização global, exigir responsabilização e garantir que a justiça ambiental para Gaza faça parte da agenda global da cúpula do clima.

Como a guerra de Israel está transformando o meio ambiente de Gaza?

Antes de outubro de 2023, quando Israel desencadeou sua guerra devastadora contra os palestinos, tanto a Faixa de Gaza quanto a Cisjordânia ocupada já sofriam graves problemas ambientais.

Um relatório do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) publicado em 2020 indicava que as décadas de ocupação israelense da Palestina, o rápido crescimento populacional acompanhado de uma urbanização desordenada e mal planejada, assim como as mudanças climáticas, eram os principais motores da degradação ambiental nos territórios palestinos ocupados.

No entanto, a atual ofensiva israelense em Gaza, onde mais de 64.800 palestinos perderam a vida, interrompeu “quase todos” os sistemas e serviços de gestão ambiental e criou novos perigos ambientais, segundo agências da ONU.

Colapso da gestão de resíduos e sistemas de esgoto

A destruição dos sistemas de gestão de resíduos sólidos e tratamento de águas residuais (esgoto) de Gaza, somada à prevenção por parte de Israel de que equipes especializadas coletem e transportem os detritos dos lixões temporários próximos a áreas residenciais e abrigos superlotados para os aterros principais, mergulhou Gaza em uma crise de lixo que torna o território quase inabitável.

Antes que a guerra fosse desencadeada no território palestino sitiado, Gaza gerava 1700 toneladas de resíduos por dia, com apenas três aterros operantes, mas sobrecarregados.

Agora, o bombardeio implacável bloqueou o acesso aos aterros designados, enquanto o bloqueio de combustível por Israel paralisou o transporte. Como resultado, centenas de milhares de toneladas de resíduos sólidos se acumularam nas ruas de todo o território.

O Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), em um estudo recente, advertiu que apenas entre 600 e 700 toneladas de resíduos estão sendo coletadas por dia, principalmente no sul de Gaza, o que mal cobre as aproximadamente 2000 toneladas geradas diariamente.

Montes de lixo acumulados perto de barracas em um campo de deslocados em Gaza. (Foto via Centro Palestino de Direitos Humanos)

A maioria dos deslocados de Gaza, famílias refugiadas em áreas improvisadas, agora são forçadas a viver ao lado de montanhas de lixo em decomposição, expostas a graves riscos à saúde.

Uma das maiores preocupações é o chorume, um líquido contaminado que se forma quando a água infiltra através de camadas de detritos em lixões não geridos, vazando para o solo e contaminando as águas subterrâneas.

Além disso, os cinco sistemas de tratamento de esgoto de Gaza pararam de funcionar, informa o PNUMA.

As águas residuais não tratadas agora contaminam praias, águas costeiras, solos e águas doces com patógenos, microplásticos e produtos químicos tóxicos.

Isso representa ameaças imediatas e de longo prazo para a saúde dos habitantes de Gaza, os ecossistemas marinhos e as terras cultiváveis, adverte o PNUMA.

Destruição da agricultura e dos sistemas alimentares

A Forensic Architecture, uma agência de investigação sediada em Londres, publicou um relatório de 827 páginas documentando as ações genocidas de Israel em Gaza.

Revelou que, entre 7 de outubro de 2023 e 30 de junho de 2024, aproximadamente 83% de toda a vegetação em Gaza foi destruída.

O relatório também constatou que 70% das terras agrícolas de Gaza — 104 km² dos 150 km² de campos e pomares — foi arrasada. Mais de 3.700 estruturas de estufas, quase metade do total, foram destruídas. Mais de 47% dos poços de água e 65% dos tanques de água foram danificados, com o estado de 29% dos poços ainda desconhecido.

Nenhuma das instalações de tratamento de esgoto de Gaza sobreviveu à ofensiva. Passou mais de um ano desde que o relatório foi emitido. As condições só pioraram à medida que a guerra genocida continua.

Imagens de satélite de antes e depois mostram rastros de veículos sobre as regiões antes férteis de Beit Lahiya, em Gaza. (Fonte: Planet Labs PBC (Esq.) antes de junho de 2023; (Dir.) depois de maio de 2024)

Em maio de 2025, uma avaliação geoespacial realizada pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) e pelo Centro de Satélites das Nações Unidas (UNOSAT) informou que menos de cinco por cento das terras cultiváveis de Gaza ainda são adequadas para o plantio.

“Em abril de 2025, mais de 80% do total de terras cultiváveis da Faixa de Gaza foi danificado (12.537 hectares de 15.053) e 77,8% é inacessível para os agricultores, restando apenas 688 hectares (4,6%) disponíveis para cultivo”, indicou o relatório.

As descobertas apontaram que Rafah e as províncias do norte da Faixa de Gaza estavam em situação especialmente crítica, com quase toda a terra cultivável inacessível.

A mesma avaliação mostrou que 71,2% das estufas de Gaza foram danificadas.

Em Rafah, a destruição de estufas disparou para 86,5% em abril de 2025, em comparação com 57,5% em dezembro de 2024. Na província de Gaza, todas as estufas foram destruídas.

Os poços agrícolas não tiveram sorte melhor: 82,8% foram danificados em Gaza, em comparação com 67,7% em dezembro de 2024.

Essas perdas paralisam a produção de alimentos e aprofundam a fome imposta por Israel.

Montanhas de entulho tóxico

Outra catástrofe ambiental é a contaminação química e por entulho derivada dos bombardeios indiscriminados de Israel, que reduziram a infraestrutura civil a escombros em uma escala sem precedentes.

O PNUMA estima que os 40 milhões de toneladas de entulho de Gaza levarão 15 anos para serem limpos — mas apenas se o bloqueio for suspenso e 105 caminhões operarem diariamente em turnos contínuos.

Para colocar o número em perspectiva, o Programa das Nações Unidas para os Assentamentos Humanos (ONU-Habitat) e o PNUMA indicaram que os escombros deixados pela guerra genocida de Israel são mais de 14 vezes o total combinado de todos os conflitos bélicos globais dos últimos 16 anos.

Os riscos à saúde são imensos. Após o 11 de Setembro, trabalhadores de limpeza expostos aos escombros tóxicos desenvolveram altas taxas de câncer e doenças respiratórias.

Em Gaza, as partículas suspensas se espalham pelo ar, solo e água, assegurando consequências de saúde de longo prazo para a população e além.

Estima-se que apenas as fibras de amianto contaminem 800.000 toneladas de entulho, o que requer tratamento especializado de resíduos perigosos.

Edificações em ruínas, após um cessar-fogo entre Israel e o HAMAS, em Jabalia, no norte da Faixa de Gaza, 21 de janeiro de 2025. (Foto: Reuters)

Enquanto isso, o uso por Israel de “armas não convencionais”, incluindo fósforo branco, causou mais estragos no território palestino sitiado.

Cientistas advertem que o fósforo branco pode destruir ecossistemas, contaminar cultivos e envenenar a cadeia alimentar, com riscos particularmente graves para a saúde de crianças e idosos.

Tem sido ligado a defeitos congênitos, já documentados em Gaza antes de outubro de 2023. Os sobreviventes agora enfrentam consequências ambientais e de saúde de longo prazo.

Embora a contaminação do solo de Gaza por metais pesados, produtos químicos e materiais radioativos permaneça desconhecida devido à falta de funcionamento dos laboratórios em Gaza, ofensivas israelenses anteriores contra Gaza envolveram munições contendo metais pesados, amianto e outros materiais perigosos que já envenenaram o solo com altas concentrações de cobalto e outros metais, segundo um estudo publicado em junho na revista científica American Journal of Public Health.

Os painéis solares (instalados inicialmente para reduzir a dependência de Israel no fornecimento elétrico) também foram destruídos pelos bombardeios e podem contaminar o solo através da lixiviação de cádmio e chumbo, de acordo com o estudo.

Portanto, devido à contaminação do solo, espera-se que os rendimentos das colheitas sejam severamente reduzidos, agravando os problemas de segurança alimentar para a população de Gaza (2,3 milhões de pessoas), e as culturas que forem colhidas estarão expostas a níveis de toxicidade potencialmente prejudiciais à saúde humana, alertaram.

Ecocídio em Gaza: Uma crise climática

A lista de danos ambientais parece interminável, e como os especialistas advertem, os efeitos não param nas fronteiras de Gaza.

Os ecossistemas regionais estão em risco e, o mais importante, o ecocídio contribui diretamente para a mudança climática global.

No mês de junho passado, um estudo realizado por uma equipe internacional de pesquisadores, coescrito pelo Dr. Benjamin Neimark, professor sênior da Universidade Queen Mary de Londres, estimou que as emissões dos primeiros 120 dias da guerra em Gaza superaram as emissões anuais de 26 países e territórios individuais.

O mesmo estudo advertiu que a reconstrução de Gaza poderia produzir 60 milhões de toneladas de CO2 — mais do que as emissões anuais de 135 países — piorando a crise climática global além do custo humano catastrófico.

A maior parte do dióxido de carbono estimado como produzido em Gaza é atribuída ao bombardeio aéreo e à invasão terrestre de Israel no território sitiado. (Foto: EPA)

Ecocídio em Gaza: ‘Parte do projeto colonial de Israel’

A partir dessas descobertas, a “Campanha Ecogenocídio” planeja expor as ações de Israel como uma forma de “eco-fascismo” durante a COP30.

O eco-fascismo, neste contexto, descreve a desvalorização da vida humana — particularmente de populações marginalizadas e colonizadas — sob o pretexto de proteger os recursos ambientais considerados como patrimônio de grupos privilegiados.

Em poucas palavras, é um ambientalismo que nega a certas pessoas o direito de viver livremente e se beneficiar de sua própria terra, tratando a natureza como algo que deve ser protegido apenas para os poderosos.

Mimi al-Laham, comentarista política sírio-australiana, instou os ativistas a enfrentarem esta realidade unindo-se à campanha e amplificando o “ecocídio” em Gaza durante a cúpula climática.

“Estamos realizando uma campanha chamada Eco-Genocídio. Você sempre ouve os esquerdistas falarem sobre o aquecimento global e os créditos de carbono, mas nunca sobre como as guerras causam muito mais dano ambiental do que usar seu ar-condicionado ou dirigir seu carro”, indicou.

“Precisamos pressionar para que abordem a destruição ambiental além do sofrimento humano em Gaza”.

Angelo Giuliano, um jornalista suíço-italiano baseado em Hong Kong, secundou o apelo em uma mensagem em vídeo, criticando a “hipocrisia” dentro dos movimentos de esquerda por ignorarem os impactos ambientais da guerra devastadora de Israel sobre Gaza.

“Aqui há hipocrisia. Eles alguma vez falam sobre o eco-genocídio de Gaza? As toneladas de bombas lançadas terão efeitos irreversíveis; a terra está tão devastada que não voltará a produzir alimentos”, afirmou Giuliano. “Você realmente se importa com o ecossistema? Então, por que permanece em silêncio?”.

A campanha do eco-genocídio em si situou o ecocídio de Israel em Gaza dentro da estrutura mais ampla de seu projeto colonial.

Em uma declaração, os organizadores apelaram ao Brasil, como anfitrião da COP30, para liderar os esforços internacionais para sancionar Israel e defender a Palestina.

“O mundo deve ouvir: Gaza não está apenas morrendo, também está ameaçando o ecossistema global. Pôr fim ao bloqueio, justiça para os palestinos e proteger o meio ambiente são chaves para a sobrevivência de todos nós”, urguiu a declaração.


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